Lei de Organizações Criminosas: o que diz a Lei 12.850/2013 e por que ela é tão importante?

Julia Konofal
Julia Konofal
4 minutos de leitura

A Lei 12.850/2013, também conhecida como Lei de Organizações Criminosas, representa um marco no combate ao crime estruturado no Brasil. Mais do que apenas definir o que é uma organização criminosa, ela estabelece instrumentos poderosos de investigação e produção de provas, como a colaboração premiada, a infiltração de agentes e a cooperação internacional. Por isso, quem estuda para concursos públicos ou deseja entender melhor o sistema penal brasileiro precisa conhecer os principais pontos dessa norma.

Neste artigo, vamos apresentar uma visão geral sobre essa legislação tão relevante, explicando sua natureza jurídica, seu âmbito de aplicação e as ferramentas processuais que ela trouxe para o ordenamento jurídico. Tudo isso de forma clara, direta e didática.

Natureza jurídica da Lei 12.850/2013

Antes de mais nada, é essencial compreender a natureza jurídica da Lei 12.850. Afinal, isso influencia diretamente a sua aplicação no tempo e no espaço.

Diferente de sua antecessora, a antiga Lei 9.034/1995, que tratava apenas de aspectos processuais, a nova legislação tem natureza híbrida. Isso significa que ela contempla tanto normas de Direito Penal material quanto normas de Direito Processual Penal.

Em outras palavras, a Lei 12.850 define crimes, como o de organização criminosa, e também apresenta mecanismos específicos para investigação e produção de prova. Essa característica é explícita logo no artigo 1º:

“Esta Lei define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal a ser aplicado.”

Essa natureza híbrida traz implicações importantes. Por exemplo, quando a lei trata de normas penais materiais, aplicam-se princípios como o da legalidade e da irretroatividade. Já em relação aos dispositivos processuais, vale o princípio da imediatividade.

Em quais situações essa lei é aplicada?

Outro ponto fundamental para quem estuda a Lei 12.850 é entender em que contextos ela se aplica. A própria legislação é clara ao estabelecer três situações distintas em que suas regras podem ser utilizadas:

1. Casos envolvendo organizações criminosas

O primeiro e mais óbvio campo de aplicação da lei é quando há a investigação ou o julgamento de crimes cometidos por organizações criminosas. Mas o que caracteriza uma organização criminosa?

Segundo o artigo 1º, §1º da Lei 12.850, trata-se de:

“Associação de quatro ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a quatro anos, ou que sejam de caráter transnacional.”

Ou seja, não basta que haja um grupo de pessoas cometendo crimes. É preciso que exista organização, divisão de tarefas e um objetivo comum.

2. Infrações penais transnacionais previstas em tratados internacionais

A segunda possibilidade de aplicação da lei é nos casos de crimes transnacionais que estejam previstos em tratados ou convenções internacionais assinados pelo Brasil. Nesse caso, é necessário observar dois requisitos:

  • O crime precisa ultrapassar fronteiras (por exemplo, ter início em um país e término em outro);
  • Deve estar previsto em um acordo internacional que o Brasil reconheça formalmente.

Por exemplo, o tráfico internacional de armas (art. 18 do Estatuto do Desarmamento) e o tráfico internacional de drogas (art. 33 c/c art. 70 da Lei de Drogas) se enquadram nesse critério. Isso porque o Brasil é signatário de tratados internacionais como:

  • Protocolo contra a fabricação e o tráfico ilícito de armas de fogo, promulgado pelo Decreto nº 5.941/2006;
  • Convenção Interamericana contra a fabricação e o tráfico ilícito de armas de fogo, Decreto nº 3.229/1999;
  • Convenção de Viena das Nações Unidas sobre Substâncias Psicotrópicas, Decreto nº 79.388/1977.

Nesses casos, os mecanismos previstos na Lei 12.850 — como escutas, delações, infiltrações — podem ser plenamente utilizados.

3. Combate a organizações terroristas

Por fim, a Lei 12.850 também se aplica a organizações terroristas. Isso está expresso no artigo 1º, §2º, inciso II. No entanto, por muito tempo a lei não definia o que seria uma organização terrorista. Por essa razão, a doutrina adotou o chamado Critério da Lista Universal, que considera como organização terrorista aquelas assim reconhecidas pelo Conselho de Segurança da ONU, como Al-Qaeda, Talibã e Estado Islâmico.

Posteriormente, com a promulgação da Lei 13.260/2016, o Brasil passou a ter um conceito interno de terrorismo, complementando esse ponto.

Meios especiais de investigação previstos na lei

Um dos grandes avanços da Lei de Organizações Criminosas foi a introdução de técnicas modernas de investigação e produção de provas. Essas ferramentas são fundamentais para desarticular grupos complexos e bem estruturados. Veja algumas das principais:

1. Colaboração premiada

Talvez o instituto mais conhecido, a colaboração premiada permite que um dos investigados forneça informações relevantes sobre o grupo criminoso em troca de benefícios penais. Vale lembrar que esse acordo só tem validade se for homologado por um juiz, que deve verificar a legalidade e a voluntariedade do depoimento.

2. Infiltração de agentes

A lei também autoriza que policiais se infiltrem em organizações criminosas, com autorização judicial. Essa medida é extremamente sensível e deve ser aplicada com rigor, pois envolve riscos e questões éticas importantes.

3. Ação controlada

Outro mecanismo importante é a chamada ação controlada. Trata-se da possibilidade de retardar a intervenção policial para que a investigação possa identificar todos os envolvidos e compreender melhor a estrutura da organização criminosa.

4. Cooperação entre órgãos nacionais e internacionais

A complexidade do crime organizado exige atuação conjunta entre diferentes instituições. A Lei 12.850 fomenta a cooperação entre órgãos como Polícia Federal, Ministério Público, Receita Federal, além de agências internacionais, como Interpol e ONU.

Dicas para provas de concursos

Se você está se preparando para concursos públicos, especialmente os da área jurídica ou policial, fique atento aos seguintes pontos:

  • A natureza híbrida da lei é uma informação recorrente em provas;
  • Saber os três âmbitos de aplicação da lei é essencial para responder corretamente questões objetivas e discursivas;
  • Entender a diferença entre organização criminosa e organização terrorista pode ser decisivo;
  • Os dispositivos relacionados à colaboração premiada e à infiltração de agentes aparecem com frequência nas bancas.

Conclusão

A Lei 12.850/2013 não apenas trouxe uma definição clara de organização criminosa, mas também fortaleceu o aparato investigativo do Estado frente a crimes complexos. Por ser uma lei de natureza híbrida, ela une dispositivos penais e processuais, tornando-se uma ferramenta poderosa contra o crime organizado, o tráfico internacional e o terrorismo.

Para quem está começando a estudar Direito Penal ou se preparando para concursos, dominar os fundamentos dessa legislação é mais do que uma obrigação — é uma estratégia inteligente.


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